segunda-feira, 14 de setembro de 2015

O AROMA DA NOITE

A noite suspira, com seu perfume de espera, com sua cor de conformismo que se apagará apenas quando amanhecer.

Somente os notívagos entendem os aromas, as melodias e os paladares da noite. No entanto, nem eles sabem o que é varar noites e dias a meditar naquilo que se vê, mas para o qual não se encontra explicação.

Como se faz para descrever de maneira compreensível isso? Essa coisa louca, esse ar de tragédia que toma conta do ambiente, vez ou outra, e que dá um nó na garganta de quem a pressente?

E mesmo assim, mesmo diante do perigo, não é possível descrevê-lo, não é possível provar sua existência; nem seu gosto, nem sua cor e muito menos apontar sua causa.

Como se convence alguém de uma maldade não ocorrida ainda; de que, mesmo com todo o cuidado que se tomou, o inimigo já está a sua porta, já adentrou em sua casa e se instalou no cômodo mais importante, com seu ar de inocência induvidosa?

Mas eu o vejo, eu o vejo pela janela deste cômodo. Sinto sua malícia, o odor adocicado que exala de sua boca por sentir o gosto antecipado do sangue que irá derramar.

Eu vejo seus olhos oblíquos percorrendo o ambiente do qual se adonou e onde não há mais aquela luminosidade que tanto conforto e alegria trazia para quem ali vive.

Não há como expulsá-lo. 

Não há meio científico ou de outra espécie que possa, nesse instante, mandá-lo embora, ou para o lugar em que merece estar confinado; ou que consiga acabar com sua influência e exterminar os rastros de suas atrocidades, tão visíveis para mim e tão ocultos para os outros.

Será ingenuidade ter uma mísera esperança de que, quando o dia raiar, todos esses fatos e sensações surgirão, com sua verdade dura, contudo, purificante, diante dos teus olhos e que decidirás exorcizar essa presença malévola?

Será possível crer que o pesadelo terminará no exato momento em que deve terminar e que nada, nenhuma dor resultará dessa visita tenebrosa?

Não, creio que não.

Na realidade, talvez eu deva partir desse castelo antes que o dia raie e eu veja que tu e todos que o habitam jazem mortos, porque não quiseram decifrar esse mistério.