Estou sentado no sofá, debaixo da escada, local onde sei que muitos ficam esperando. Na minha frente uma porta está aberta para uma sala escura. Acima da minha cabeça, deslizando pela escada, escuto as notas melancólicas de um violino, fazendo meu peito se apertar.
Estou aqui sentado; aguardo o momento em que ouvirei meu nome. Então, terei que deixar esse cantinho, confortável e semiescuro, embora tenha uma porta que se abre, como uma boca desdentada e assustadora, para uma sala negra, e por sobre esse canto se apoie alguma coisa invisível e sem sentimentos.
No andar de cima o violino para de ser tocado repentinamente. Em seguida, surge uma música, rápida, meio enlouquecida. Sinto o pelo dos braços e da nuca se eriçarem e meus nervos, que parecem normais, se quebram sob a intensidade da escuridão da sala e da música que escuto.
Eu deveria fugir, mas não consigo. Estou paralisado pelo ambiente que existe aqui. Além do que, fugir para onde? A sala me arrepia, a escada me fere com seus degraus, repletos de silêncios e estalos, e a rua, bem, a rua eu pouco conheço; ela me deixa apavorado com sua claridade, seu barulho e com as pessoas que voluteiam, quase sem sentido ou direção, pelas calçadas.
Tudo é tão confuso lá fora!
Por isso, fico sentado, sentindo o suor escorrer pelas costas, com as pernas coladas uma na outra, os braços tensos, as mãos espalmadas sobre as pernas. Elas também suam, e se eu levantar ambas contra a semiluz que vem do corredor será possível ver que elas tremem levemente.
Outra vez aquela música triste recomeça: um refrão, depois outro e outro, até que o violino silencia totalmente, depois de acabar com a última gota de coragem que eu tinha.
A hora chegou.
Uma porta é aberta. Ouço passos se aproximando da escada e o peso de um pé no primeiro degrau, que estala sob a leveza de um corpo que se aproxima calmamente.
Na sala a escuridão se adensa. O par de pés, socados dentro de botas lustrosas, chega, enfim, ao primeiro andar, o solado batendo contra o piso de madeira, tão tranquilo e firme ao mesmo tempo.
Arrepio.
Viro a cara para a escuridão da sala a minha frente. Eu deveria ter entrado nela. 'Seria um alívio momentâneo', penso, soltando o ar que eu havia represado nos pulmões. Chega a doer quando libero o oxigênio que conti.
Quando volto o rosto, lá está.
O cabelo preto cuidadosamente penteado para o lado, o sorriso branco e aqueles olhos – aqueles olhos onde a perversidade se oculta por detrás de uma azulada inocência.